O Conselho Nacional de Seguros Privados (CNSP) aprovou, hoje (13), a redução nos valores do seguro obrigatório DPVAT. A taxa é paga anualmente por todos os condutores brasileiros. A decisão foi tomada após reunião da CNSP, ontem (12), e em meio a investigação de fraudes por desvio de verbas e irregularidades na indenização de vítimas de acidentes de trânsito, noticiados com exclusividade pelo AutoPapo.
Em nota, o CNSP, que é parte do Ministério da Fazenda, apontou o combate que a Seguradora Líder tem feito às fraudes como a razão para a diminuição nos valores. Entretanto, ao contrário do que a Líder afirma, a verdadeira razão para a redução foi a descoberta de fraudes cometidas pela própria empresa, reveladas pela Operação Tempo de Despertar, da Polícia Federal.
A nova tabela do seguro obrigatório apresenta reduções de até 79%, de acordo com a categoria do veículo.
Para os automóveis particulares, o seguro obrigatório caiu de R$ 41,40 para R$ 12, uma redução de 71%. Já para as motocicletas e motonetas, o valor cai de R$ 180,65 para R$ 80,11, diminuição de 56%. Segundo o Ministério, as motociletas tiveram reajuste menos expressivo porque “concentram 74% das indenizações, apesar de representarem apenas 27% da frota nacional”.
As reduções começam a valer em 2019. Confira os novos valores para o seguro obrigatório:
De acordo com o Ministério da Fazenda, a diminuição nos valores ocorreu devido a um acúmulo de reservas técnicas pela administração do Seguro DPVAT:
“A redução dos prêmios tarifários foi possível devido ao montante de recursos acumulado em reservas técnicas superior às necessidades atuariais do Seguro DPVAT. Tal excesso é consequência das ações de combate à fraude que levaram à uma redução significativa dos sinistros somado à rentabilidade dos recursos acumulados”, divulgou o órgão.
Contudo, essa é a narrativa que a própria empresa vem construindo quando, na verdade, seus ex-diretores e ex-conselheiros estiveram amplamente envolvidos na fraude.
“Reservas técnicas” são dinheiro do povo recolhido indevidamente
Como já foi mostrado pelo AutoPapo em cobertura das fraudes do DPVAT, a Seguradora Líder, consórcio de companhias de seguro responsável por administrar o seguro, cobrou um valor maior do que o necessário dos contribuintes. Foram R$ 4.8 bilhões arrecadados indevidamente pelo Estado para este conglomerado de empresas privadas, em uma rede de corrupção descoberta pela durante a Operação Tempo de Despertar, da Polícia Federal.
Ao mesmo tempo, como também foi revelado pelas investigações policias, uma complexa cadeia, com diversos atores diferentes, operou um esquema de desvio das verbas a partir de pedidos de indenização falsos. O seguro obrigatório DPVAT dá, a qualquer cidadão brasileiro, o direito a uma reparação após acidentes de trânsito de qualquer espécie.
São esses R$ 4.8 bilhões, que nunca foram devolvidos ao povo, que compõem as “reservas técnicas” da Seguradora Líder e possibilitam, agora, essa drástica diminuição nos valores do seguro.
Indenização tem sido negada a vítimas de trânsito
Após desviar dinheiro público recolhido pelo Estado, crime descoberto pela Polícia Federal de Montes Claros em 2015, a Seguradora Líder passou a “combater fraudes”. Segundo narrativa divulgada pela seguradora, ela tem tomado atitudes para evitar pedidos fraudulentos de indenização.
Dados da própria empresa mostram uma redução no pagamentos de indenizações em 2018. Contudo, procuradores que atuam junto a vítimas de trânsito vêm denunciado uma realidade diferente.
Segundo os profissionais, a Seguradora Líder tem negado o pagamento de indenizações a vítimas de trânsito legítimas, e agindo de forma irregular na análise de pedidos pela cobertura. Casos noticiados pelo AutoPapo mostram uma vítima de atropelamento que faleceu após um ano de internação sem ter sua condição de invalidez reconhecida pela Líder e sem receber qualquer tipo de compensação.
De acordo com procuradores com os quais o AutoPapo conversou, o caso não é exceção, e as recusas de indenização por parte da Líder têm se tornado sistemáticas.
Essa prática, aliada aos recursos previamente desviados da população brasileira, além de valores de cobertura que não são reajustados há 10 anos, são o que justificam as “reservas técnicas” do seguro obrigatório DPVAT nas mãos da Líder.
Como afirmou o próprio Ministério da Fazenda, os recursos de que o Seguro DPVAT dispõe atualmente são “mais que suficientes” para garantir suas operações no futuro.
AutoPapo continua recebendo denúncias de vítimas que não foram indenizadas
Enquanto isso, o AutoPapo continua recebendo denúncias de casos em a Seguradora Líder se recusa a indenizar vítimas de trânsito legítimas. O último desses casos foi o de José Marcondes Mascena de Sousa.
Como se vê nas fotografias, a vítima tem uma lesão grave no braço esquerdo. Ainda assim, de acordo com o denunciante, Ademir Veras, da empresa Veras Seguro DPVAT, após ter recebido a documentação médica do caso, a Líder segue recusando a indenização de invalidez dessa vítima de acidente de trânsito.
Expectativas para o futuro do seguro obrigatório
Esperava-se que a reunião do Conselho Nacional de Seguros Privados (CNSP), ontem (12), decidisse pela dissolução do consórcio que controla a Seguradora Líder e representa um monopólio na administração de fundos públicos.
A atitude não foi tomada devido ao interesse dos órgãos governamentais envolvidos com a Seguradora Líder em manter a máquina de dinheiro em funcionamento.
Espera-se que, no começo do ano que vem, com a mudança da diretoria da Superintendência de Seguros Privados (Susep), da Federação Nacional de Seguros Gerais (FenSeg), e da Confederação Nacional das Empresas de Seguros Gerais (CNseg), envolvidas na administração do DPVAT, poderá haver, enfim, a quebra desse monopólio.
A partir do ano que vem, permaneceria o Seguro de Danos Pessoais Causados por Veículos Automotores de Vias Terrestres (DPVAT), porém, o condutor poderia escolher para qual seguradora ele quer pagar o seguro obrigatório. Assim, ocorreria a dissolução da Seguradora Líder, um consórcio de companhias de seguro que representa um monopólio, único no mundo a administrar o seguro obrigatório de automóveis.
Saiba tudo sobre as fraudes da Líder contra o povo brasileiro com 10 fatos básicos
Além disso, aguarda-se, ainda, o fim à impunidade dos envolvidos nas fraudes do seguro obrigatório. O caso está fartamente documentado pela Polícia Federal, desde a Operação Tempo de Despertar, de 2015, já tendo passado pelo Ministério Público Federal (MPF) de Minas Gerais e duas Comissões Parlamentares de Inquérito (CPI) sem chegar a conclusões satisfatórias
Em 2019, com os novos ventos que soprarão no Ministério da Justiça, aumentam as possibilidades de que esses responsáveis sejam punidos.