A exemplo do que fizeram servidores da Advocacia-Geral da União (AGU) e procuradores da Fazenda Nacional há cerca de sete meses, entregando os cargos de confiança que possuíam, funcionários de carreira da Superintendência de Seguros Privados (Susep), com postos de chefia, colocaram seus cargos à disposição no primeiro dia do mês. E tal como no caso da AGU e da Fazenda Nacional, eles estão amparados pelo compromisso dos demais servidores em não ocuparem os lugares vagos. A medida deixa o órgão de fiscalização do mercado de seguros brasileiro sem comando.
Já no começo de novembro, os servidores manifestaram sua preocupação com os efeitos da reforma ministerial na Susep, queixando-se do uso da autarquia por políticos dos partidos PTB e Solidariedade, e por não conseguirem atuar tecnicamente em problemas detectados, por exemplo, na área do seguro DPVAT, que foi alvo inclusive de uma CPI na Câmara dos Deputados.
A posição dos servidores, à época, foi manifestada em carta encaminhada pelo Sindicato Nacional dos Servidores da Susep (SindSusep) ao titular do órgão, Joaquim Mendanha, e ao Ministério da Fazenda. A decisão agora da entrega dos cargos de chefia, manifestada em nota do sindicato, foi uma resposta à decisão da autarquia de retirar o único servidor de carreira no Conselho Diretor, que ocupava a Diretoria de Supervisão de Solvência e que foi entregue a uma “pessoa estranha aos quadros da autarquia”. Há mais de 15 anos essa área é comandada por representantes do quadro da Susep.
Confira a nota do SindSusep:
SUSEP: Não é só pelos R$ 0,20, nem por cargos
No dia 1° de dezembro os servidores de carreira da Susep (autarquia federal, vinculada ao Ministério da Fazenda, que fiscaliza reservas de cerca de R$ 1 trilhão dos mercados de seguros, capitalização e previdência – PGBL e VGBL) colocaram seus cargos à disposição, lastreados pelo compromisso dos demais servidores em não assumi-los. Abriram mão de gratificações, projetos e carreira, porque desejam um país melhor.
São mais de 95% dos servidores da Susep indignados com mais uma mudança repentina de rumo da autarquia que, há quase uma década, não possui um direcionamento claro e consistente, alvejada por trocas sucessivas de seus comandantes.
Repentinamente e sem ouvir os apelos do corpo técnico da autarquia, o governo decidiu exonerar o único servidor de carreira de sua Diretoria, embora em seus quadros haja, inclusive, inúmeros PhDs, Mestres ou pós-graduados. Após a contínua permanência, por mais de 15 anos, de pelo menos um diretor de carreira no Conselho Diretor, inaugura-se um vácuo de representação da casa, o que agrava o receio de que a autarquia se torne mais um entre os tantos órgãos que não cumprem seu papel no Estado. Um órgão em que o interesse público não prevaleça. Sem a presença de um diretor dos quadros da Casa, a alta administração da Susep perde seu compromisso com o longo prazo.
Há um profundo sentimento de desrespeito que já não cabe dentro de cada servidor, análogo ao processo de expulsão, expurgo de quem foi punido por apenas-e-tão-somente fazer a coisa certa. Não se trata de motim, de revolta ou de insurreição. Trata-se da autoestima, do respeito a si e à instituição e, fundamentalmente, da submissão aos conceitos mais nobres da função pública: servir ao povo.
Confira a íntegra da carta do SindSusep:
Rio de Janeiro, 16 de novembro de 2017.
Senhor Superintendente e Sr. Ministro de Estado da Fazenda,
Os servidores tomaram conhecimento da notícia sobre a intenção ministerial em substituir o único servidor de carreira da Susep nomeado para a diretoria desta Autarquia, por mais um agente externo ao seu quadro, indicado politicamente. Diante desse fato, os servidores demonstraram repúdio a esta situação e, por intermédio do sindicato, decidiram externar sua posição.
Ilmo. Sr. Ministro, enquanto servidores deste Estado Democrático de Direito, cientes do seu dever público em manter operativo de forma eficaz um dos setores mais importantes da economia brasileira, não podemos compactuar com um processo de gestão em que os principais gestores da Autarquia, seus diretores e superintendente, são substituídos sucessivamente, por dez vezes, em um único mandato de governo (2014-2018). Logo, fazemos questão de destacar que, neste curto espaço de tempo, sofremos uma das mais profundas mudanças estruturais que, em síntese, repartiu a supervisão da entidade em duas linhas de atuação muito distintas do que sempre se praticou, desde a sua criação, em 1966.
Logo, Senhor Superintendente e Sr. Ministro de Estado da Fazenda, não é demais lembrar o recente escândalo em que vimos a nossa SUSEP ser submetida, levando ex-gestores indicados por partidos políticos às investigações policiais e comprometendo a reputação desta casa. Por conta disso, clamamos pela consciência e pela atenção de V.Sas. à relevância da boa reputação de um órgão supervisor para o exercício da sua missão institucional – o país precisa da nossa atuação.
Enquanto tentamos nos reerguer, reorganizando os nossos processos internos, a duras penas, enfrentamos todas as intempéries decorrentes da falta de estrutura (350 servidores para atuar em todo território brasileiro) e de recursos, aumentando o nosso ritmo de trabalho para nos adaptar ao Programa de Modernização Integrada do Ministério da Fazenda – PMIMF, conduzido por esse Ministério. Tudo isso, sem enfraquecer a nossa atuação supervisória (314 supervisionadas), em respeito à sociedade que paga os nossos salários, nos vemos sendo afastados do comando da Autarquia.
A composição da Diretoria da Autarquia com, pelo menos, um integrante do seu corpo funcional foi uma conquista alcançados, há mais de quinze anos ininterruptos. Acreditamos que a participação na gestão da nossa entidade de um servidor de carreira, que possua os requisitos técnicos e de gestão necessários ao cumprimento da sua missão institucional, somente fortaleça a continuidade dos bons serviços prestados à sociedade, minimizando o uso político e não republicano da SUSEP.
A propósito, sendo confirmada essa substituição sem uma alternativa viável, dentre os três nomes de servidores, que serão eleitos pela maioria e serão enviados em 21.11.2017, os servidores acordaram pela entrega, a partir da data da exoneração do servidor de carreira, dos cargos comissionados, titulares e suplentes, abaixo subscritos, com a aquiescência dos demais servidores da SUSEP, em não assumi-los, até que essa situação seja revista.
Essa decisão reflete a profunda tristeza e indignação do corpo funcional da Autarquia com o desrespeito e o descaso que têm sido dispensados por esse Governo e, em particular esse Ministério, ao Mercado de Seguros, Previdência Complementar Aberta e Capitalização e a Superintendência de Seguros Privados – SUSEP.