Em um comunicado curto, divulgado em 21 de junho, o Banco Central deu pistas de como pretende regular o mercado de criptoativos – ou ativos virtuais, como prefere o órgão. A autoridade monetária se disse disposta a criar “interações com o sistema financeiro tradicional” e conduzir uma “discussão transversal entre reguladores” para criar um arcabouço normativo a partir das diretrizes da Lei 14.478/2022 (Marco Legal das Criptomoedas).
A autoridade monetária ressaltou como uma das atribuições regulatórias zelar pela “gestão de risco” e a “mitigação de riscos” envolvendo ativos virtuais. O que se pode entender da mensagem do BC é: 1) a autoridade entende o mercado de cripto como irmão do financeiro, o que exigirá uma fiscalização contínua do Estado; 2) será preciso mensurar eventuais riscos na elaboração de códigos dos ativos criptografados para evitar fraudes. Não está claro ainda como poderá ser a equiparação do mercado de ativos digitais com o financeiro, o que será feito numa dobradinha entre o BC e a Comissão de Valores Mobiliários (CVM).
Mas o caminho para entender e minimizar os riscos foi detalhado ao JOTA por Alessandro Octaviani, chefe da Superintendência de Seguros Privados (Susep). A autarquia regula o mercado de seguros no país e tem discutido com BC, CVM e a Superintendência Nacional de Previdência Complementar (Previc) meios para criar critérios de mensuração de riscos para embasar a oferta de seguros para criptoativos. Hoje, por exemplo, caso haja bug no código de uma criptomoedas e o seu criptoativo sumir da carteira virtual de um investidor, a perda não é coberta por seguros regulados pelos órgãos.
Esta preocupação, de acordo com o superintendente da Susep, motivou discussões no âmbito do Comitê de Regulação e Fiscalização dos Mercados Financeiro, de Capitais, de Seguros, de Previdência e Capitalização (Coremec), formado pelos quatro órgãos. Um dos pontos de análise do grupo de instituições foi quanto à solidez na segurança dos bancos de dados (blockchain) usados pelos criptoativos para evitar fraudes. “A oferta de um criptoativo já envolve riscos. Que riscos? A tessitura, a manufatura daquela rede computacional para criar um criptoativo pode ser considerada uma fábrica. Quais são os desafios para colocar uma fábrica de pé? É sofrer uma intempérie externa ou ter um erro de projeto interno”, observa.
Octaviani identifica como “segunda ponta” a ser amarrada pela regulação securitária possíveis fragilidades de cibersegurança. Mais especificamente: como os criptoativos são resistentes a ataques hackers. A oferta de seguro, na visão da Susep, precisa olhar para essas duas fragilidades para definir os níveis de indenização ao investidor que deseja contratar um seguro para se precaver de eventuais perdas por risco sistêmico do criptoativo.
A superintendência, contudo, avisa que no bojo normativo deve constar o exercício do seu poder de polícia. Isso significa que haverá critérios de punição aos administradores dos ativos virtuais em casos de falhas que causem danos aos investidores segurados. “Temos que regular do ponto de vista da responsabilização civil e empresarial, e do seguro que vai tratar disso tudo. Não há dúvidas que a economia digital ou a economia dos criptoativos em si é um mercado segurador em potencial e já existente. Cabe à Susep, simultaneamente, regular do ponto de vista do poder de polícia”, afirma.
A autarquia do mercado securitário criou um grupo de trabalho para elaborar um modelo de normatização até o final de 2023. “Daqui para o final do ano, o grupo focal para a compreensão das objeções [das seguradoras] e oportunidades do cyber risk vai estar não só instituído, mas com o seu trabalho inicial completo. A partir daí são novas camadas na normatização. Até o final do ano, teremos uma agenda intensa de diálogo e de expedição de orientações ou normativas ou de projetos de normatização. Isso tudo é hoje um ponto vibrante dentro da Susep”, antecipa.
Octaviani aponta a iniciativa como inovadora e com potencial de servir de modelo a outros mercados. “O Brasil tem condições de ser um exportador mundial de segurança em tecnologia financeira, como nós já somos, aliás. Agora, temos que fazer isso expandir a ponto dos europeus virem aqui contratar a nossa capacidade de programação e gestão desse risco. Esse é um outro mercado imenso para o qual as seguradoras têm muito o que contribuir com toda a sua expertise acumulada de gestão de risco”, considera.